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A mostrar mensagens de fevereiro, 2021

Qual a força?

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Era uma vez uma rua. uma rua estreita. urbana. forrada a tecido de granito. e. nas suas margens. expressões vivas. da natureza. No regresso da surpresa que um painel. inesperado. nos provoca. e. já avançados os passos. recuamos. olhamo-lo fixamente. e. a surpresa cresce. Nele corre um azul. invulgar. Pergunto-me. diante daquela música. que passa. empoleirada num tronco de um pinheiro: qual a força que mantém o equilíbrio estático. de todos aqueles bonecos de barro. expostos em estantes de pinho. corrompido pelo vento. que adornam esta exígua horta?. a céu aberto. Penso nisto. e. olho o céu: uma rola. atravessa. com um jeito peculiar. a diagonal daquele pequeno rectângulo de terra brava.   Eugénia  

Do lado de lá...

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Da tua janela   além da casa, onde tu moras, olha ainda a hora do poente; as ruas por onde costumas caminhar; repara no azul klein a cobrir o céu; o amarelo ouro, ao fundo, tingindo ramos de árvore, despidos, à espera de poder pousar com segurança no horizonte marinho; escuta o sussurro das aves; das aves que habitam as noites.   além da casa, onde tu moras, olha ainda a hora do nascente; as ruas por onde costumas caminhar; repara no verde veronese a cobrir a terra; o amarelo, ao fundo, tingindo ramos de árvore, à espera de poder transmutar seu ouro com segurança elaborando a seiva; escuta o sussurro das aves; das aves que habitam os dias.   recolhe ainda teu sonho devagar        devagar      sem medo   em cada alvorada, a vida espera por nós.     Eugénia  

Pequenas notas 10.

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Olhei o fim da manhã e vi um azul. um azul líquido ultramarino. a transbordar do céu. tingido pela humidade e por uma nuvem branca. Vi um ninho. agarrado aos ramos de uma árvore. o passarinho não estava lá. mas talvez. talvez regresse quando o botão aberto em flor lhe dê a mão. e talvez cante.   Eugénia  

Magnólias 6.

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  no celúrio           cálido do meio-dia a flor abre    –    rosa   Eugénia

Numa jarra azul

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Atravessei a rua. lugar onde moro. Hoje. lugar de eleição pela serenidade que me inspira. As tintas azuis a colorirem o céu. sem incómodos para o silêncio. Como de costume. fui ficando a olhar. a luz. particularmente contemplativa. a deixar-se cair. tão lentamente. sobre cada um dos ramos. nus. da árvore. Modo magnífico de acalentar a seiva. Ninguém atravessava a rua. ninguém animava o lugar. nenhum voo no céu. somente as tintas azuis a resvalarem do alto até ao chão. Fui-me afastando. devagar. fui fechando o silêncio. dentro de mim. Desci a rua. para comprar um lírio. um lírio azul. . Numa jarra azul um lírio azul – no vidro coalhado a palavra verso. . Cintilam lírios de água no jardim de Monet – voa um verso branco na asa de uma libélula.   Eugénia

Retomo o caminho da manhã

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Retomo o caminho da manhã   Temos enfim uma luz uma luz monótona e frágil; mas com ela o contorno da flor ficou mais bem definido   – traços rosa.   .   Com as mãos de inverno o vento afagou uma só pétala – e   a pétala caiu desamparada.   .   Segui o rumo do vento – tive a certeza   do silêncio.   e na sua ausência   ouço uma música – piano – escondida por detrás de uma janela     Eugénia

Estórias de quintais 3.

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  Era o início da tarde – o sol a pique; e a luz entornada sobre as árvores, ao fundo do quintal. O silêncio quente tinha adormecido a terra. Ao ouvir, de súbito, o v oo de uma pequena ave, voltei-me e apercebi-me que o silêncio mudara; e que as suas asas eram azuis e destemidas e descansam, a caminho do céu, sobre uma haste de figueira. Retive a respiração, com receio de que algum mínimo rumor a inquietasse; e não cantasse. Na voz do chapim-azul, o trinado tem um não sei quê de cristal...   Eugénia

Toadas

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Toadas do silêncio   Quando o rumor se esgota na folha da ameixoeira e o silêncio cai e abraça a ausência a ninhada de melros naquele velho galho de glicínia o musgo adornando escadas rurais de granito entre duas leiras e o alecrim a florir a berma do degrau mais elevado.   Quando o silêncio cai e abraça a ausência a memória se levanta o tacto burila a doçura esbelta da tua mão na pele da minha a borboleta branca com as asas carregadas de efémera existência recorta passagens por entre flores.   Conversávamos debaixo das mesmas telhas por onde se derramavam raízes de líquen os bancos de madeira a trave o aroma do fruto da ameixoeira até que incansável a luz desenhava no crepúsculo a tua voz transitando os nossos temas por livros, por canções, por poemas.   Agora o silêncio desfila pela rua que atravessa a entrada da casa com os passos empoeirados   somente projecta um fio de sombra sobre o bulício do rio.   Eugénia

Magnólias 5.

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  No tear da noite tudo é gesto mão  verso  silêncio abrem-se janelas ao sonho – florimos.   Eugénia

Sombras

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Luz cálida – luz cálida – a matriz do silêncio   nas sombras.   Eugénia  

i nau dí vel

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Ao aproximarem-se os finais de fevereiro. e. quando. o sol. já não tarda a abrir a manhã. azulando o céu. alvejando as nuvens. uma quanta humidade. gotejando. ali. uma quanta cor céu. sublinhando veios. acolá. sobreviventes. então. as flores brancas. e frágeis. começam a pontilhar. os ramos da cerejeira.   Pétala frágil efémera Nela a queda o eco que segue a queda   como trinado i  nau  dí  vel   entretecendo rodopiando no próprio ar.   Eugénia

Magnólias 4.

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Escuto o azul do céu por entre ramos de flor. . Azul de fevereiro – o melro não sabe que a magnólia já floriu. . Efémera é a pétala – voo de borboleta.   Eugénia  

Magnólias 3.

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É   no silêncio do vidro o rumor da luz. É   nos veios tenros da folha o pulsar da seiva.   Eugénia

Estórias de quintais 2.

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  Era parda e tinha o corpo coberto de penas de seda fina pintalgada – pintas brancas. E, no cocuruto depenado, a crista folhosa da cor do fogo – dia a dia incendiada pelo sol. Nos primeiros minutos da manhã, empoleirada numa trepa lenhosa da velha azálea, a galinha pedrês erguia o bico, de ave cantadeira, e cacarejava – cacaracá... Palavras soletradas, sílaba a sílaba – ca ca ra cá –, idas nos ares. Ao acordar o dia. Então a luz do sol entrava no quintal e aí ficava horas e horas seguidas, alvoroçada, por entre aromas de hortelã e alfazema. Lá para o fim da tarde, o sol espreguiçava-se – ensonado – e deixava-se dormir para além do horizonte. E o quintal mergulhava no escuro.   Eugénia

Lá bem no alto

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Vi no alto                  lá bem no alto na fronteira da ramagem da cerejeira brava                               uma ave   talvez um melro     talvez um melro   diante de um céu molhado.   O guia das aves diz-nos que o canto do melro é melodioso           flauteado.   Esperei.                Sem pressa.   A ave não cantou.  Mas pude imaginar a melodia de flauta            no ritmo das asas          a voltejar por entre as primeiras flores brancas                             e                               sombras matinais.   Eugénia

Esteios de um caminho

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Aos esteios de um caminho Ouço na amplidão dos teus passos que alagam teus pés descalços acordes modelando teu destino. Ouço a tua dança no vento na voz do melro no gotejo de uma nuvem tecida em tear de delicados fios não de algodão mas de água percorrendo seu rasto na segurança dos céus. Vejo a tua capa tons verdes axadrezados baixando dos teus ombros compassados até teus pés descalços. E foi perante o meu espanto por aquela tua dança como água florida nascida ao acaso num deserto que me sonhei com um violino na mão cordas percutindo timbres no abrigo das estrelas ao início das manhãs. Eugénia

Pela noite adiante

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  Pela noite adiante Sonhei com um lírio branco na mão ocre da terra debrum de água a dirigir-se para o mar com silêncios vindos de dentro dela vozes a soltarem-se da corda dedilhada Sonhei com o aroma bordado de um voo um pássaro desconhecido um peixe escama verde sal areia adentro impulsos do mar solfejados em poema cantados na penedia.   Eugénia

O silêncio

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O silêncio instalou-se nos corais do céu instalou-se nas paragens da avenida na seiva a progredir dentro da terra   nas asas dos pombos no rosto de Flora – o corpo resguardado em seu avental de flores – no brilho das estrelas   postadas na Estrada de Santiago.   Recordo o dia e a hora.   Eugénia

Pequenas notas 9.

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Esta manhã foi a humidade que lavrou os portais do céu. onde asas circulam. anónimas. por sobre lentas veredas nubladas.   Aqui uma grinalda lisa. mas incerta. aflorando. camélia a camélia. em cada ramo.   Eugénia  

Iluminando raízes

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Nuvem – bálsamo de água pura iluminando raízes; envoltas no manto ocre de terra seca.   Eugénia  

Carícias

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Céu azul   nuvem branca – carícias de astro-rei na minha pele.   Eugénia  

Nuvens brancas

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quis tactear a nuvem com a ponta dos meus dedos – toquei na voz de um passarinho . florescem nuvens por entre amantes residentes do céu . com lápis-aguarela desenhei um peixe-voador a planar sobre uma gota de água   Eugénia

Aos ombros do vento

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Inauguração   A manhã chegou e com ela inaugura-se uma nova luz a colorir de azul toda a atmosfera; na nuvem, a promessa de água.   E sobre aquele azul líquido entre a terra e a nuvem os ramos enfeitam-se; submersos brilham como Vénus.   Reconheço – avançando de longe – uma zoada; solfejada como oração.   E, então, pergunto-me: Antecipação dos bandos de melros aos ombros do vento?   Assim pensei supondo regaço aqueles ramos adornados – gota a gota esculpidos pela mão da água.   Estávamos em Fevereiro.   Eugénia

Esquissos

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Uma mão estranha traça esquissos de árvore, aqui e acolá. e um pássaro resguarda-se do vento num dos seus ramos.   Na berma dos meus sonhos tremeluz o azul- -lírio – do agapanto.   Eugénia  

Estrelas

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Do parapeito da janela   Em criança. quando a noite escurecia. pousava os cotovelos no parapeito da janela. e. dali. o rosto entre as mãos. via as estrelas. Havia nelas uma luz branca. cintilante. quase nota musical. baixando da escuridão. das colinas. das ramagens. dos telhados. até às águas do rio. Dali. era-me consentido ver. com outra emoção. irrepetível. a cintilação das águas. por entre a dormência dos peixes.   Não sabia o que das estrelas faz luz branca. cadente – reservada ao nosso olhar. Eugénia  

Magnólias 2.

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Azuis e Ouro No inverno, por entre fronteiras de granito – húmido azulado –, o murmúrio da seiva – a construção da flor: sussurrante beleza branca de seus tepals envolvidos por um vago azul celestial frio –, preparando com lindezas sonoras a fertilidade – ocultada por folhas luzidias – dos pássaros errantes da cidade – pássaros que dançam e cantam –; desafiando com vindouros azuis – de céus primaveris – o granito, a mostrar a sua roupa mais dourada. E sinto a inexorável palpitação dos ponteiros do relógio circular; no alto da Estação de São Bento incrustados no tempo.   Eugénia

Magnólias - 1.

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É a humidade    a chama – o véu – que veste a magnólia.   .   Procura bem debaixo o verso – no cálice da flor.   Eugénia