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A mostrar mensagens de janeiro, 2021

Estórias de quintais - 1.

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O quintal era estreito e longo. A terra escura. O céu azul. E os sinais do vento lento sobre as plantas herbáceas – a ondularem serenas. A queda das sementes sobre a terra. E a restolhada dos pássaros, à volta das canas altas. Tinha nove anos. E assim que a manhã chegava corria para o quintal. O potro – um garrano da cor do oiro velho – já lá andava, à espera; as pernas juvenis a trote, sob o cheiro profundo do ar matinal. A crina clara a voltejar... devagar...   Eugénia

No muro, Verdes Anos

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Restrinjo o espaço às fronteiras do inesperado. Ignoro o movimento o ronrom do eixo de rotação da Terra tangendo a rua com acrílicos de céu nocturno. Ouço a corda dedilhada. Verdes Anos.   Eugénia  

Quietude

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De alguns céus se diz que são silenciosos dominando a quietude; iluminados por sóis claros, de inverno. E eis aqui o sol branco naquela sua maneira desvanecida quase táctil de cobrir as árvores desnudadas – musical.   Quietude – contudo o rumor das aves.   Eugénia  

Os cravos

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Os cravos Houve um tempo em que os meus sentidos se abriam com os olhos postos nas árvores, de copa redonda, abertas ao sol. Quando o sol dourava, as folhas dessas copas tornavam-se lustrosas e à sua volta as asas dos pássaros luziam demoradas no céu. E certamente por miraculosa coincidência, os pombos arrulhavam aos pares, tocando seus bicos. Entre março e abril, o sol expandia-se e: As mimosas inclinavam-se ao peso da sua própria floração. E os rios circulavam, a seus pés, povoados de pólen. As frésias dos atalhos, compondo indizíveis populações de múltiplas cores, permitiam ao ar a sua fragrância misturada com o cheiro puro da terra. E tudo era cor. E tudo era doce. E tudo flor. Houve um tempo em que os sonhos partiam em barcas voantes, mirando as copas das árvores, escutando as canções das crianças, espreitando o voo dos pássaros; cantando ao sol, as flores. Houve um tempo em que, sob o céu – no qual o sol pousava para que a seiva se elaborasse na copa das árvores

As palavras

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As palavras I Há palavras sem cor. Há palavras coloridas. Há palavras com travor. Há palavras insubmissas, de amor. Palavras com asas arrojadas onde se aloja todo o significado da Vida. São palavras de esperança. De imensa esperança. Escorrem pelos veios do coração. Galgam o peito e partem com asas de vento, à sua volta tudo se forma e transforma. São palavras necessárias. Palavras intencionais. Audíveis, com toda a humanidade                  dentro. Dançam nos ouvidos das pessoas e entram no coração.   II Há sempre uma palavra. Uma palavra consequente. Uma palavra necessária. Justa. Essa palavra pode ser uma qualquer palavra. Uma palavra existente ou uma palavra inventada. Uma palavra ponderada ou uma palavra utópica. Necessariamente necessária. Uma palavra coroada de cravos rubros. Essa palavra pode ser senha, arado, semente. Sobretudo                          Arma. Sobretudo                         Não.   III Depois. Haverá o

A treva

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A treva Eu podia dizer: sol – caído nos ramos da oliveira. Mas quanta terra esboroada. Quantas searas onde só o espontâneo tremoço - azul - e a papoila germinam.                E, os trigos?   Eu podia dizer: sol – caído no sal do cais de onde parte o navio. Para outro porto de abrigo. Mas quanto silêncio gemido nas bordas do areal. Quantas redes de fio enlaçado precocemente em baús arrecadadas sem destino            E, os cardumes dos mares?   Eu podia dizer: sol – caído em múltiplos arcos – íris – sobre o vidro. Mas quantas janelas a descoberto onde paredes se desnudam. As mãos vazias. As flores dos solitários recolhidas.             E, os risos?   Mágico caleidoscópio, o sol: multiplica os pássaros no céu inventa os verdes dos bosques. Recria o fogo do amor     acorda ansiosos corações     nas primaveras. Anima o voo da abelha    obreira    na azáfama do mel. As suas mãos afagam a agulha do pinheiro, geram a semente e a toutinegra canta no ter

Pela mão da Primavera

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Há um tempo em que as ruas florescem pela mão da Primavera; e o céu torna-se mais azul.        Uma ave      pousa o voo –      sobre rosas.      .      Ah, a borboleta      cobre a sombra de uma flor –      azálea branca.   Eugénia * aguarela-colagem sobre papel de embrulho

O Sol amanhece

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Agora o Sol amanhece desnuda-se a neblina   Ouço a toada das vestes que logo caem no regaço do granito   O Sol amanhece   e   logo tece a alga   tece o tempo   a voz do búzio tece a flor de sal      e a luz é clara   Tece as lendas do ocaso da rosa-dos-ventos   a cor púrpura da rosa   Eugénia

Pequenas notas 8.

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Chegou em silêncio. abraçado àquela serenidade. Escolheu onde pousar. e aí ficou. Mais tarde. ouvi um canto. que nascia do próprio coração dos encantos. Desfolhava vibrações. como pião a rolar. sobre palma da mão de criança.   Eugénia  

Sombras

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  Só a luz desenha toda a cor – o cerúleo do azul o ocre da terra o verde do musgo. e Não é só a cor que brilha – é também a sombra.   Eugénia

Ao fundo: a Felicidade

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Ao fundo: a Felicidade   Aqui    nos encontramos ! O poema chega-nos de Grândola             vila morena e sustém o canto – nosso.     A voz é grave. A flor é rubra.    A mão é firme               e sinaliza a rota. Enquanto a luz da tarde resoluta               amanhece o coração da cidade. Aqui vamos ! As folhas novas abrem verdes     por entre punhos. E cada clamor sai do nosso peito               unanimemente como gotas de água virgem que brota da nascente e cresce limpa irrigando veios em direcção ao mar. Aqui vamos ! A palavra do poema vem-nos do Poeta e sustém o corpo – nosso.     O sol é Abril. A flor é o cravo.     O passo é amplo e determinado. Em uníssono               o nosso canto. Trazemos a paz ao peito                                     como emblema. A crença dos vitoriosos              à flor da pele.     O espírito limpo. Sabemos da ave das águas                                       argêntea cigana a cantar o sol

Pequenas notas - 7.

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  O rio corre sem murmúrios. Espera-o a flor do cardo. Na fronteira do mar. Meus olhos cinzelam seu fio de ouro preso ao sol.   Eugénia

A sina

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A sina rompe toda a pele A seda nos olhos as rugas do luto O lábio cerrado o grito na boca O travo da sina o restolho das trevas A palavra um verso e uma réstia de luz   O fruto distante o pulso do punho O sangue na veia o bolso vazio O grito do luto a luta do voo E o rubor de um cravo na palma da mão   A luz que se expande das notas de um canto A semente de um fruto na linha do sol O eco do grito o eco do punho E o rubor de um cravo na palma da mão   A pele a sina e a essência da luta O rubor de um cravo a voz e o pulso A palavra que é bela no seio de um verso E a janela que se abre na enseada do céu.     Eugénia  

Pequenas notas - 6.

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A tarde cheia de brancura e inocência curva o rosto – por lágrimas humedecido – sobre cada uma das pétalas das camélias. Eugénia  

Leme . Inverno

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Com pressa de regressar a casa o sol chega cedo ao horizonte  – mão firme manobra o leme. Eugénia  

A dança

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Eu vi o lilás das anémonas            a dançar                         na maresia como se fosse um pássaro.   Eu vi o azul marinho das vagas da maré-alta            a dançar                           na ventania como se fosse um príncipe.   Eu o violeta            das algas que vestem de tinto as rochas negras            marinhas a dançar           a dançar.   Eu vi o sol flamejante            arrebol pousado no horizonte como se fosse um mágico.   Vi a dança        doce            das cores do mar no tempo da nudez íntima das árvores…     Eugénia

Quando

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Quando mil companheiros marcham a nosso lado florindo vozes lembro as papoilas vertendo seus vermelhos líquidos por sobre o oiro das searas.   Quando mil companheiros dançam a nosso lado sulcando vagas lembro paraísos de que se fala – onde florescem livres velhos sonhos – a que ainda não chegamos.   Quando mil companheiros cantam a nosso lado lavrando abismos ao ritmo dos nossos passos   esse clamor cercará – como inquebrável cordel – a crueza das infrutíferas fadigas. E   libertará as primevas flores de Abril.   Eugénia

Voos

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Soube então  das sombras  –  onde a modéstia dos voos. Eugénia

Sabemos

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  Sabemos   Sabemos dos ventos que ondulam trigais das sementes que da terra brotam verdes erectas a germinarem seu fruto como criança que respira o primeiro ar. Sabemos dos voos das folhas de encontro aos astros; das estrelas-do-mar.   Sabemos do suor feito mágoa sofrida em músculos humanos por quotidianos agrestes – corações ceifados. Sabemos das notícias dos jornais de terras irmãs em poucos segundos reduzidas a escombros.   Sabemos que a perda da esperança deflagra como bomba dentro de nós; e que tudo se perde quando se perde a paz.   Sabemos dos fabricantes de ruínas. Sabemos do sangue esvaído na luta pelo pão. Sabemos que as sementes florescem do entreaberto da nossa mão. Sabemos caminhar com braços dados a olhar em frente. Sabemos cerrar os lábios.   Sabemos dos horizontes claros.   Sabemos. E por aqui andamos a mascar do dia-a-dia o tédio que nos dão; a roer no quotidiano as unhas com os braços caídos dos ombros inquietos ao longo do corpo; divorciados dos braços de nossos ir

Devagar

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O tempo do canto do melro – roupagem preta azeviche – é quando o dia amanhece; ou na bainha das noites. empoleirado num galho.         também o melro anda de-         -vagar         ao lado do sol miudinho   Eugénia

Pequenas notas - 5.

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  Ó, gaivota.  Quis gravar aquele voo resumido naquelas duas asas. num verso. esculpido em sete sílabas. para lá dentro guardar o rompimento do céu pela quilha. e. ao mesmo tempo. o equilíbrio sereno. dos ramos. por cima. Fui. então. buscar uma folha de papel. azul. luzidio.   Eugénia

Pequenas notas - 4.

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Apenas uma luz - uma luz serena - percorre o rosto da cidade, onde cabem todos os sonhos da adolescência. E, eu  - ainda -  trago comigo a flor de sol. Eugénia  

Semáforos

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  Neste lugar onde se adensa o azul  – medito sobre teus olhos verdes. . Sei da asa sonora do voo – atravesso para te abraçar.   Eugénia