A treva


A treva

Eu podia dizer: sol –

caído nos ramos da oliveira. Mas quanta terra esboroada.

Quantas searas onde só o espontâneo tremoço - azul - e a papoila

germinam.                E, os trigos?

 

Eu podia dizer: sol –

caído no sal do cais de onde parte o navio. Para outro porto de abrigo.

Mas quanto silêncio gemido nas bordas do areal.

Quantas redes de fio enlaçado precocemente em baús arrecadadas

sem destino            E, os cardumes dos mares?

 

Eu podia dizer: sol –

caído em múltiplos arcos – íris – sobre o vidro. Mas quantas janelas a descoberto

onde paredes se desnudam. As mãos vazias. As flores dos solitários

recolhidas.             E, os risos?

 

Mágico caleidoscópio, o sol: multiplica os pássaros no céu inventa os verdes dos bosques.

Recria o fogo do amor     acorda ansiosos corações     nas primaveras.

Anima o voo da abelha    obreira    na azáfama do mel.

As suas mãos afagam a agulha do pinheiro, geram a semente e a toutinegra canta no terreiro.

Mas a correnteza de lágrimas secas rebrilha como cristal. Em declive

sobre braços soçobrados. Sobre fome.

 

A treva.

 

As mimosas de março florescem no limiar do céu.

Eu podia dizer sol.

 

Eugénia | Abril.2012


 

 

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