Outros sinais


No catálogo

A arte tem a ver com o «coração»: é pretexto supremo para o espanto - estímulo que, pelo seu conteúdo estético, transborda da obra artística e se projecta infinitamente no espectador.

É afirmação de sentimento: inspira emoções!

Perante a exposição «Novos Sinais» de José Alberto Mar, hoje exposta no Auditório Municipal de Gaia, e como simples espectadora, procuro abarcar a sua plenitude; e descobrir a significação de cada uma das suas composições; a sua riqueza intrínseca.

E o que vejo? E como as entendo?

Todas elas integram um conjunto de elementos cromáticos (preto, branco, cor luminosa ou ouro) e título, com efeitos de forma diferenciados: certamente, devidos à versatilidade plástica e ao labor criativo; ao inter-relacionamento suis generis de símbolos - acordes; puzzles de ritmo e harmonias, marcando a construção estética de cada uma.

A simbologia adoptada acentua o diálogo entre o geométrico e o orgânico. Traz-me à memória figurações do período geométrico da arte grega mas que, afinal, são bem diferentes:

São símbolos, previamente criados e desenhados a tinta-da-china sobre papel - compondo um alfabeto aberto, passível de ser ampliado; e dinâmico. Símbolos disponíveis - tal como as letras que usamos na composição dos versos - para serem usados e primorosamente enquadrados, segundo o imaginário do artista. Permitem-lhe «infinitas» combinações e cadências. E em cada uma das suas subtilezas, um sentido.

Recurso a uma linguagem metafórica?

Os «Novos Sinais», ao disseminarem imaginários, multiplicam sentidos: seduzem-nos. E, daí:

O deleite que se retira de - tocados pela visão e através de interpretações subjectivas -, perscrutar as interpretações do artista que, perante a Vida e até perante o amplo Universo, deram origem a cada uma das suas obras aqui expostas. Unas? Certamente.

São panoramas harmónicos: revelam o diálogo entre a mão criadora e o olhar imaginativo do pintor, enquanto preenche o seu espaço com valores simbólicos e cor - tinta-da-china e acrílico. Oferecem-nos a possibilidade de sentir e imaginar, para além do visível...

E os rostos sonhadores: o perfil longo e rectilíneo; os olhos acolhidos pelo céu branco; guiados pelas aves? Perscrutam os astros? Soltando-se os sonhos?

O símbolo - dourado - traz-me a nítida voz do poeta, José Alberto Mar, registada, outrora no seu livro, «A primeira imagem»:

«o ouro, dizes, navega pelo sangue entra e sai pelos poros e o olhar torna-se o lugar das aparições, inaugura o tempo que vem escondido sob os primeiros sinais das madrugadas.»


E em cada subtileza, um sentido...

Pássaro  sete cores
ousado   pousa o canto
no arco  -íris

(Deambulando pelo arco-íris)

Em noite de verão
há estrelas em bandos
- sob o sol, dormem os astros.

(A céu aberto)

No rito
dos meus passos
aproxima-se outro tempo.

(Mudanças)

Diálogos
habitam veios sanguíneos
- coroados de palavras.

(Diálogo)

Aos meus pés
cai resoluta
uma pétala rosa.

(Sol Rosa)

Empurro a porta
o sol atravessa o horizonte
- mil labaredas marinhas.

(A Porta Para)

Pedra e pedra
flor tecida
- em tear de sol.

(Flor dos Anéis)

Nestas águas tingidas de vermelho
move-se o tempo   a grande calma
- anémona    -de-mar.

(A Ciência das Ilhas)


Exposição: Pintura, «Outros Sinais» | José Alberto Mar
2015: Galeria do Auditório Municipal de Gaia.
Texto para catálogo: Eugénia Soares Lopes

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