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A mostrar mensagens de novembro, 2021

Anoto instantes por onde vou

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Anoto instantes por onde vou É uma rosa uma rosa encostada ao outono É numa jarra manchada pela transparência do vidro uma quase haste herbácea de roseira enfeitada com botões inclina a sua sombra perfil fio curvo sobre o ponto cheio da toalha de linho que cobre o tampo da mesa restaurada onde me sento sombra líquida a nadar na tisana cor-de-mirtilo É uma curva feita de lápis-lazúli a enveredar pelo céu enrugado como papel artesanal pardo à espera dos primeiros rabiscos de sol após a chuva uma espécie de alquimia em dias pardacentos Eugénia

No final de uma manhã

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Aconteceu no final de uma manhã. de outono. de céu brando. embora ainda azul. uma gaivota. uma gaivota-de-patas-amarelas. percorria a sombra. no respeito pela grande esperança. ora para lá. parava. olhava. contornava o corpo. olhava. parava. ora para cá. Ao jardim eu fui colher o vento pousado numa folha de oliveira; despedia-se do voo uma gaivota-de-patas- -amarelas. . Sombra de novembro pego no meu bloco de notas - desenho uma gaivota. Eugénia  

Dando guarida ao outono

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Dando guarida ao outono. nasce. no declive da aurora. uma nova cor. ferrugem. ferrugem é cor. é oxidação. é vocábulo. vermelho-alaranjado. a pontear ramos. inundados de luz. branca. quase despida de sóis. é essa a sua marca. A partir daqui. uma folha cai. outra folha cai. compondo floresta folheada. renasce a seiva. pulsa o coração da terra. E: Um pombo-torcaz lança voo - olho na direcção do lanço mas só lá estava o volteio de uma folha de liquidâmbar Oh: Um rosto sonha à janela - no parapeito vasos de cíclame Eugénia  

Tronco . Liso

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Tronco . Liso No tronco erodido pelo vento, liso, pela quentura de verão, pelo esvaecimento outonal, há uma pintura feita de veios envernizados de romantismo uma paisagem de cor que só a imaginação livre pose decifrar. Se isto fosse uma planície seriam papoilas a declinarem o sol na transição alaranjada do vermelho de papoila para amarelo crepúsculo, sob azulados celestes; dunas, elevando-se das areias molhadas pequenos gladíolos silvestres. Se fossem variações de palavras seria um cordelinho de versos; por afinidade, acordes; o inaudível timbre de um sonho. Eugénia  

O teu poema

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Veio. os passos sem pressa. vi-o ao longe. trazia o caderno no bolso. para escrever o poema. Olhava o poente. o fulgor da chama. intensa. a desvanecer-se na água. Contemplativo. pressentia-se-lhe a respiração no rosto. Sem outra saída que não fosse escrever. sentou-se num pedregulho. e. mesmo de longe se ouvia. a entrar-nos pelas janelas. o alvoroço das algas. a rodearem-lhe os pés. umas castanhas. outras verdes. e. até. vermelhas. o sal na água. Vi-o de mais perto. estava a escrever. . Eu lerei o teu poema - a dois passos das estrelas. Eugénia  

Em viagem

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Passadas as chuvas. percorreu caminhos. periféricos. olhou as moradias. os cortinados. fechados. olhou o relógio. lá estavam os ponteiros. móveis. no seu pulso. ouviu a entoação do silêncio. as lágrimas que caíam dos telhados. viu os crisântemos. em flor. a treparem os canteiros. as folhas. nervuras secas. ruíam. a seus pés. - Um dia tentarei desenhar este silêncio - com a cor das noites. Perscrutou os astros. percorriam caminhos. numa luz distante da dos dias. por onde as aves não têm acesso. . À araucária, Vénus pede-lhe uma estrela - acolhe-a  segue viagem. . Eugénia

Jardins suspensos

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  Os jardins suspensos urbanos definem cores vegetais povoadas de oxigénio que se espalham no ar, inclinando-se sobre as ruas. Enquanto os olhares dos transeuntes se erguem e repousam a sua azáfama lá no alto. Motivam o efémero descanso. O deleite. Por vezes, surgem-nos inesperados no olhar, em ruas onde o movimento circula intenso; e a pedra é granito. Eugénia

Círculo branco

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  Na berma do rio nasce um lírio branco. No círculo branco, veios de sol. Eugénia

Outros sinais

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No catálogo A arte tem a ver com o «coração»: é pretexto supremo para o espanto - estímulo que, pelo seu conteúdo estético, transborda da obra artística e se projecta infinitamente no espectador. É afirmação de sentimento: inspira emoções! Perante a exposição «Novos Sinais» de José Alberto Mar, hoje exposta no Auditório Municipal de Gaia, e como simples espectadora, procuro abarcar a sua plenitude; e descobrir a significação de cada uma das suas composições; a sua riqueza intrínseca. E o que vejo? E como as entendo? Todas elas integram um conjunto de elementos cromáticos (preto, branco, cor luminosa ou ouro) e título, com efeitos de forma diferenciados: certamente, devidos à versatilidade plástica e ao labor criativo; ao inter-relacionamento suis generis de símbolos - acordes; puzzles de ritmo e harmonias, marcando a construção estética de cada uma. A simbologia adoptada acentua o diálogo entre o geométrico e o orgânico. Traz-me à memória figurações do período geométrico da arte grega

Rosto sonhador e explosão dos sonhos

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O perfil é longo, retilíneo. Lembra horizontes de pedra - uma pedra consistente, lisa, sem ornamentos, milenar. A linha dos lábios tem o rasto do calor humano o halo irremediável da inquietude                                                  dos sonhos. Há o mesmo halo na aparição das pétalas; nos umbrais de onde partem os voos ou sobre as velas guiadas pelo vento, em viagem; nos olhos dourados daqueles que traçam novos caminhos, divergindo de seus próprios passos, já dados.                                                   Os sonhos. A esperança que possuem. Percutem alicerces secos; desmoronam realidades áridas como semente que incandesce a terra como brisa que desfia raios de luz nos rostos como nota musical que se solta da pauta numa explosão                                             de harmonias. Exposição de Pintura & Desenho: «A dança dos quadrados» | José Alberto Mar 2013: Espaço Q / Quadra S oltas - Porto. Texto: Eugénia Soares Lopes

Quietude

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Quietude O perfil crescente da lua irrompeu sobre restos de crepúsculo. Tudo permaneceu quieto: nenhuma folha se moveu nenhum pássaro levantou voo ninguém passava na rua pelas dez-da-noite; nenhum fundo rosa se alterou na extensão nocturna do céu. Eugénia